Não faltam pesquisas indicando que os ultraprocessados trazem uma série de danos à nossa saúde. Mas, de modo geral, há um sério obstáculo nessas pesquisas: apesar de haver uma correlação clara entre o consumo desse tipo de comida e um grande número de doenças, ainda não é fácil demonstrar causalidade ou como esse dano opera, na prática, em nosso organismo.

Pois um estudo recém-publicado por pesquisadores brasileiros, vinculados à Universidade de São Paulo (USP) e à Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), no Rio Grande do Sul, pode ajudar a desvendar essa história.

Segundo o trabalho divulgado na revista Nutrients, um alto consumo de ultraprocessados pode estar ligado a modificações químicas no DNA capazes de alterar a expressão gênica, fazendo as doenças aparecerem.

Entenda melhor como foi feito o estudo, considerado piloto, e o que significam seus achados.

Como foi feito o estudo e o que ele descobriu

Os pesquisadores realizaram uma análise observacional de 30 mulheres, divididas em grupos de acordo com seus hábitos alimentares. Elas foram agrupadas conforme a classificação NOVA, que separa alimentos, ingredientes culinários e bebidas em categorias como in natura, minimamente processados, processados e ultraprocessados.

Naquelas que apresentavam um alto consumo de alimentos ultraprocessados, foi possível detectar modificações em 80 regiões do genoma. Esse desequilíbrio genômico associado a uma alimentação dominada pelos ultraprocessados sugere que o consumo desses produtos poderia ativar genes que normalmente estariam “silenciados”.

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Não se trata de uma alteração propriamente dita na sequência do DNA, mas na chamada expressão gênica: aqueles genes herdados que já temos presentes em nosso DNA, mas só “aparecem” causando impactos na saúde como consequência do estilo de vida. Em termos leigos, é como se esses alimentos acionassem um botão de “liga” para potenciais problemas genéticos que estavam “desligados” até então.

Caso esse mecanismo epigenético seja demonstrado em estudos mais amplos, a alteração poderia ser o elo faltante para explicar com mais precisão a relação já conhecida entre ultraprocessados, obesidade e doenças crônicas não transmissíveis.

Mas é importante destacar que o trabalho não analisou se as modificações eram causadas pelos ultraprocessados ou se já estavam presentes nesse grupo de voluntárias por outros motivos.

Próximos passos da investigação

O estudo vem a se somar a uma crescente quantidade de evidências contraindicando o consumo regular de ultraprocessados na alimentação, mas ainda exige pesquisas maiores para consolidar os resultados.

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Limitações incluem a pequena amostra do grupo observado e o caráter transversal do trabalho, o que não permite estabelecer uma relação de causa e efeito nesta fase da pesquisa.

O objetivo dos pesquisadores, agora, é fazer um estudo longitudinal com um grupo maior. Essa abordagem permitiria acompanhar uma quantidade maior de participantes em um prazo mais longo, observando mudanças e possíveis causalidades nesse caminho.

Entender como os ultraprocessados efetivamente afetam a nossa saúde é fundamental em um contexto em que eles estão cada vez mais presentes na rotina: no Brasil, hoje, 20% de nossa dieta já é composta por esse tipo de alimento.

Ao redor do mundo, 2025 foi o primeiro ano em que a quantidade de crianças obesas superou a de subnutridas, uma nova realidade atribuída à presença cada vez mais precoce de ultraprocessados na dieta (e em quantidades crescentes).

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Pesquisas vêm reforçando perigos dos ultraprocessados

Várias pesquisas nos últimos anos têm demonstrando uma correlação entre o consumo de ultraprocessados e uma série de alterações de saúde. A lista inclui compulsão alimentar, obesidade, puberdade precoce, câncer colorretal e distúrbios do sono, entre muitos outros problemas.

Para fugir de encrencas, a recomendação de especialistas é priorizar ao máximo os produtos in natura e minimamente processados, reduzindo o consumo de itens industrializados com grandes quantidades de conservantes, corantes e outros aditivos, além de quantidades excessivas de açúcar, sódio e gorduras saturadas.

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