Cinco dólares. Quase trinta reais. Esse é o preço atualmente de uma dúzia de ovos no Estados Unidos, um preço recorde por lá. E tudo isso por causa da gripe das galinhas, causada pelo vírus H5N1, que mata as poedeiras e faz com que os custos de produção de ovos subam.

Mas ficar sem ovos para a omelete no café da manhã não é a maior preocupação: mais de 900 pessoas já pegaram esse mesmo vírus e quase a metade delas morreu.

O que temos que entender é como esse vírus pulou das galinhas para as pessoas e tentar prever o que vem depois, o que é tão complicado quanto fazer um ovo parar em pé.

Quem pegou o H5N1 aviário foram pessoas que trabalham com criação de galinhas, como veterinária(o)s, trabalhadores de granjas e quem mais entrou contato com as aves doentes, que eliminam o vírus em sprays pelo bico e também pelas fezes.

Mas, se existem milhares de pessoas atuando para fazer tantas granjas de ovos funcionarem, porque o número de casos de H5N1 em humanos não é maior?

Já dissecamos o vírus da gripe em uma outra coluna, mas há detalhes importantes aqui. Acontece que o vírus da gripe das aves é bem exigente quando de trata de buscar uma entrada para as células, processo necessário para sua sobrevivência.

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Para ter sucesso, a proteína viral chamada de hemaglutinina H, da qual existem 18 tipos possíveis (o H5N1 tem o H tipo 5; o N se refere a uma outra proteína viral) tem que se ancorar no receptor que está na parte de fora da célula. Só que existem variações de receptores e cada vírus da gripe se dá melhor em um tipo.

No caso do H5N1, ele adora o receptor das galinhas, mas tem dificuldades em usar receptores humanos, daí a raridade dos casos. E, em uma célula humana, ele não está no seu habitat natural. Por tudo isso, mesmo que uma pessoa pegue o H5N1, ela não passará a outra pessoa.

Mas esse H5N1 está fazendo coisas muito surpreendentes, que nunca tínhamos visto. Ele já passou por tigres, leopardos, leões, gatos, cães, raposas, leões marinhos, golfinhos e tem se dado muito bem em vacas leiteiras nos Estados Unidos.

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As vacas não só ficam doentes, mas também, como as galinhas, transmitem para pessoas próximas nas fazendas de gado leiteiro, além de passarem o vírus pelo leite não pasteurizado. E isso afeta a produção de leite, e daí para o preço subir é um pulo.

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Mas, de novo, a preocupação não é só com o café da manhã: esse H5N1 está indo muito bem em mamíferos e pode ser que acabe aprendendo a pular de pessoa a pessoa, evoluindo em saltos graças a sua rápida mutação.

Essa é a preocupação atual de cientistas que olham para a Virosfera. Ainda mais porque não temos imunidade específica contra 0 H5N1, já que os tipos H1N1 e H3N2, além de influenza B, são os mais frequentes entre nós e são os que estão nas vacinas que devemos tomar todos os anos.

O resultado pode ser uma pandemia tão grave que faria a de covid-19 parecer um voo de galinha.

Por aqui no Brasil, esse H5N1 não chegou em vacas ou galinhas industriais, nem em pessoas. Mas já foi achado em aves silvestres e em galinhas de fundo de quintal.

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Uma boa notícia é que os antivirais contra a gripe comum também funcionam contra o H5N1. Quanto a vacinas, O Instituto Butantan, meu vizinho aqui na USP, está desenvolvendo uma vacina H5 para ser usada caso necessária.

Pode ser que esse H5N1 se adapte bem a humanos. Pode ser que não. Em se tratando do vírus influenza, a única certeza é a mudança.

Mas o certo é que é necessário investir em escalonar a produção e distribuição de antivirais e vacinas. Também é preciso ter um plano pronto de emergência sanitária que considere ajustes de estrutura, insumos hospitalares e estrutura de diagnóstico, no que falhamos terrivelmente na covid-19. 

Tudo isso tem que chegar a quem vai precisar e não só a quem pode pagar. Todos, incluindo governos e as grandes indústrias farmacêuticas, têm que ceder para o enfrentamento dar certo. Como se diz, não há como fazer omelete sem quebrar ovos.

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