A doença de Crohn é uma das principais doenças inflamatórias do trato gastrointestinal e vem aumentando de forma contínua em vários países, inclusive no Brasil, sobretudo entre jovens adultos.

Trata-se de uma condição crônica, marcada por inflamação persistente, que pode acometer qualquer segmento do tubo digestivo, embora o íleo terminal e o cólon sejam os mais acometidos. Alternando períodos de crise e remissão, a doença impacta a qualidade de vida, a rotina social e o desempenho profissional.

Ainda assim, os avanços das últimas décadas, especialmente na compreensão das bases imunológicas e no desenvolvimento de terapias biológicas, transformaram o cuidado e ampliaram as possibilidades de controle. Este artigo apresenta, de forma clara e baseada em evidências, o que a ciência sabe hoje sobre a doença de Crohn.

O que é a doença de Crohn?

A doença de Crohn é uma inflamação crônica que atinge todas as camadas da parede intestinal, podendo causar úlceras profundas, fístulas, estenoses e abscessos.

Uma de suas características marcantes é o padrão de “lesões em salto”, no qual áreas inflamadas se alternam com segmentos de mucosa saudável. A inflamação decorre de uma resposta imunológica desregulada a estímulos do ambiente intestinal, levando a agressão persistente ao tecido, que pode se manifestar de forma localizada ou evoluir para formas mais complexas e sistêmicas.

Causas da doença de Crohn

A etiologia da doença de Crohn envolve a interação de múltiplos fatores. No campo genético, mais de 200 variantes foram associadas ao risco da doença, com destaque para o gene NOD2. A predisposição, porém, não determina o desenvolvimento, apenas aumenta a vulnerabilidade.

O microbioma intestinal exerce papel central. Pacientes com Crohn apresentam disbiose, caracterizada por redução de bactérias protetoras e aumento de espécies pró-inflamatórias. Essa alteração desequilibra a barreira intestinal e desencadeia hiperativação de vias imunes.

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Entre os fatores ambientais, o tabagismo é o mais fortemente associado, aumentando tanto o risco de aparecimento quanto de agravamento da doença.

Dietas ricas em ultraprocessados, uso repetido de antibióticos na infância, estresse crônico e poluição do ar também têm sido investigados como contribuintes, com diferentes níveis de evidência. Por fim, há clara desregulação imunológica, envolvendo citocinas como TNF-alfa, IL-12, IL-23 e vias JAK-STAT, responsáveis por manter a inflamação ativa.

+Leia também: O papel da dieta no controle das doenças inflamatórias intestinais

Sintomas da doença de Crohn

Os sintomas dependem do local acometido e da intensidade da inflamação. Dor abdominal recorrente, muitas vezes no quadrante inferior direito, e diarreia crônica com ou sem sangue são os achados mais frequentes.

Perda de peso, inapetência, sensação de distensão e episódios de suboclusão também podem ocorrer, especialmente em casos de estenoses (estreitamentos). Quando há doença perianal, surgem fístulas e abscessos, que provocam dor, secreção e grande impacto na qualidade de vida.

A doença de Crohn também pode produzir manifestações fora do intestino. Artrites, lesões de pele como eritema nodoso, inflamações oculares e doenças hepáticas são relativamente comuns. Sinais de alarme, como febre persistente, dor abdominal intensa, vômitos biliosos, sangramento importante e perda de peso acelerada, exigem avaliação médica imediata.

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Diagnóstico da doença de Crohn

O diagnóstico é construído a partir de uma análise integrada de sintomas, exames laboratoriais, endoscopia, métodos de imagem e histopatologia. Não existe um exame único capaz de confirmá-lo. Exames de sangue avaliam inflamação, anemia e carências nutricionais, e a calprotectina fecal é um marcador sensível de inflamação intestinal.

A colonoscopia é essencial, pois permite visibilidade direta das lesões típicas e coleta de biópsias. Para avaliação do intestino delgado, a enteroressonância magnética é o exame de escolha por sua precisão e ausência de radiação.

A tomografia é útil em situações de urgência, sobretudo diante de suspeita de abscessos. A cápsula endoscópica pode complementar a investigação, mas apenas quando o risco de estenose for mínimo.

Diagnóstico diferencial

Diversas condições podem simular Doença de Crohn, incluindo:

Diferenciar essas doenças é fundamental para oferecer tratamento adequado e evitar atrasos terapêuticos.

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Tratamento da doença de Crohn

O tratamento tem como metas alcançar e manter remissão clínica e endoscópica, preservar o intestino e prevenir complicações. Estratégias gerais incluem parar de fumar, melhorar hábitos alimentares, corrigir deficiências nutricionais e buscar acompanhamento multidisciplinar.

Corticoides são usados para crises agudas, mas não devem ser mantidos por longos períodos. Imunomoduladores, como azatioprina, mercaptopurina e metotrexato, podem ajudar na manutenção da remissão. As terapias biológicas revolucionaram o cuidado: anti-TNF (infliximabe, adalimumabe), anti-integrina (vedolizumabe) e anti-IL-12/23 (ustekinumabe) são opções eficazes, seguras e amplamente utilizadas.

Novos biológicos anti-IL-23 seletivos e inibidores de JAK ampliam ainda mais o arsenal terapêutico, especialmente em casos moderados a graves.

Cerca de metade dos pacientes necessitará de cirurgia ao longo da vida, seja para tratar estenoses, fístulas complexas ou doença refratária. Técnicas modernas, como a laparoscopia e as ressecções segmentares, favorecem resultados melhores e preservação de tecido.

A importância do acompanhamento médico especializado

A doença de Crohn exige acompanhamento contínuo com gastroenterologista ou coloproctologista experiente em doenças inflamatórias intestinais (DII).

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A avaliação regular permite detectar precocemente complicações, ajustar o tratamento conforme a resposta, monitorar efeitos colaterais dos medicamentos e orientar medidas de prevenção, como vacinação e rastreamento de câncer colorretal.

As diretrizes internacionais recomendam consultas periódicas mesmo em fases de remissão, pois a doença pode evoluir silenciosamente. Além disso, o cuidado especializado reduz hospitalizações, melhora a adesão terapêutica e aumenta as chances de manter remissão duradoura.

Conclusão prática

A Doença de Crohn é desafiadora, crônica e exige atenção a longo prazo, mas as possibilidades de controle nunca foram tão eficientes quanto hoje. O diagnóstico precoce, a escolha adequada da terapia e o acompanhamento regular com especialista são pilares que reduzem complicações, aumentam o bem-estar e permitem que o paciente leve uma vida plena e produtiva.

Este conteúdo é informativo e não substitui consulta médica, diagnóstico individualizado ou acompanhamento profissional contínuo.

*Antonio Couceiro Lopes, cirurgião do aparelho digestivo e membro da Brazil Health

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(Este texto foi produzido em uma parceria exclusiva entre VEJA SAÚDE e Brazil Health)

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