Enquanto o mundo passa a encarar a obesidade como uma doença crônica, complexa e multifatorial, as inovações terapêuticas, especialmente no campo dos medicamentos, abrem caminho a uma transformação no modo de entender e enfrentar esse problema de saúde pública que afeta mais de 1 bilhão de pessoas globalmente.

Remédios como Mounjaro e Wegovy — baseados na tirzepatida e na semaglutida, respectivamente — começaram a escrever um novo capítulo nessa história.

Mas é prudente frisar que nenhuma medicação sozinha será suficiente para erradicar a obesidade. Isso depende de mudanças sustentadas no estilo de vida, acesso à educação e à informação confiável e políticas públicas.

Feitas as ponderações, digo que o futuro do tratamento é auspicioso. E gostaria de mostrar o que vem por aí, na esteira de estudos clínicos conduzidos mundo afora.

Wegovy em comprimido e em dose mais potente

Começo com o comprimido diário e turbinado de semaglutida (dose de 25 mg). É uma dosagem maior que a formulação via oral já comercializada no país (Rybelsus). Em pesquisa, pessoas com obesidade tratadas com essa nova versão de 25 mg alcançaram uma redução média de 16,6% no peso corporal após 64 semanas de uso — ante apenas 2,7% do grupo que tomou placebo, pílulas sem o princípio ativo de verdade.

Essa medicação, ainda não aprovada pelas agências regulatórias, será uma alternativa interessante a quem não gosta de tomar injeções e amplia o acesso dos pacientes ao arsenal terapêutico.

Outra novidade bastante relevante à vista são as canetas de semaglutida injetável na dose mais potente de 7,2 mg. O ensaio clínico que a avaliou demonstrou perda de 20% do peso corporal, em média, após 72 semanas. Sim, um indivíduo com 100 kg passou a pesar 80, o que traz outros benefícios à saúde.

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Nessa análise, 33% dos participantes que usaram as canetas de 7,2 mg de semaglutida reduziram 25% ou mais da massa corporal —efeito que lembra o do concorrente Mounjaro.

Retatrutida: tripla ação

Da mesma fabricante do Mounjaro vem a retatrutida, injeção semanal subcutânea que age em três receptores hormonais e pode inaugurar uma nova classe farmacológica.

Um estudo apontou reduções médias na faixa de 24% em 38 semanas de uso: cinco em cada dez participantes perderam ao menos 20% do peso e 25% deles enxugaram mais de 30% — resultado próximo ao de uma cirurgia bariátrica. Até o momento, parece ser o medicamento em pesquisa com o maior impacto na redução do peso.

Cagrisema: caneta 2 em 1

Outra estratégia é combinar princípios ativos na mesma caneta. É o caso da Cagrisema, que alia a semaglutida à cagrilintida. Em doses semanais, houve um papel sinérgico no controle do peso.

Após 68 semanas, pessoas tratadas com a combinação apresentaram redução média de peso de 22,7%, ante 16,1% no grupo que usou semaglutida (2,4 mg) isolada. O Cagrisema representa uma evolução: integra dois caminhos para regular o apetite, o esvaziamento gástrico e o metabolismo.

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Injeção mensal

Mais um remédio que age em polos distintos é o maridebart cafraglutida, apelidado no meio médico de MariTide. É uma injeção subcutânea aplicada uma vez por mês!

Ela ativa os receptores de GLP-1, como faz a semaglutida, e bloqueia os receptores do GIP — que são acionados pela tirzepatida. Pois essa estratégia gerou perda de peso média de 20% após 52 semanas de testes. A vantagem da dose mensal, claro, é facilitar a adesão ao tratamento.

Foco na queima de gordura

Na lista do que deve vir por aí, também consta a survodutida, mais uma caneta de aplicação semanal, mas com um novo mecanismo de ação: ela imita tanto o hormônio GLP-1 quanto o glucagon. Na prática, isso retarda o esvaziamento do estômago, diminui o apetite e estimula a saciedade ao mesmo tempo que eleva o gasto energético e a quebra de gordura corporal.

No estudo clínico, a redução média de peso beirou os 15% depois de 46 semanas, com o destaque de que boa parte dessa perda foi atribuída à eliminação de gordura — ora, sabemos que as medicações atuais também levam massa muscular embora. Pesquisas mais amplas tentarão comprovar a segurança e a eficácia dessa tática.

+Leia também: Obesidade: novos remédios, velhos dilemas

Para preservar os músculos

Olhando além da balança e tendo em vista que a preservação da musculatura é sinônimo de saúde, sobressaem no horizonte terapias que buscam, em meio ao processo de emagrecimento, resguardar ou até mesmo aumentar a massa muscular. Sim, a ideia é perder mais gordura e ganhar músculo.

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A linha de pesquisa mais promissora envolve fármacos chamados de inibidores das vias da miosatina e das activinas — ambas são proteínas que naturalmente inibem o crescimento muscular. Anticorpos como o trevogrumabe, o garetosmabe e o bimagrumabe visam justamente bloqueá-las para assegurar a massa magra durante a perda de peso.

A proposta é combinar esses tratamentos injetáveis aos medicamentos para obesidade. Em um ensaio clínico que ganhou destaque, a aplicação na veia do bimagrumabe, combinado ao uso da semaglutida, gerou perda de peso na casa dos 20%, sendo que a diminuição de massa muscular foi 70% menor em comparação ao uso isolado da semaglutida.

O que muda e o que não muda no futuro

O futuro do tratamento da obesidade aponta para uma era de medicamentos poderosos e cada vez mais refinados que tornam possível atingir perdas de peso antes inimagináveis — e com preservação dos músculos. Entretanto, é imprescindível compreender que um remédio sozinho não basta.

Para que essas inovações façam efeito no mundo real, precisamos da conscientização e do engajamento dos pacientes em mudanças de estilo de vida — nenhuma picada ou comprimido vai substituir a dieta e a atividade física —, da criação de ambientes menos obesogênicos (com a alta oferta de comida calórica barata e pouco tempo ou espaço para praticar esportes, por exemplo) e de políticas públicas que viabilizem o acesso aos avanços científicos. Não existem injeção ou pílula milagrosas.

O futuro no controle da obesidade continua dependendo de um tratamento amplo e estrutural.

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