Por muito tempo, o câncer de garganta esteve associado principalmente ao tabagismo e ao consumo excessivo de bebidas alcoólicas, afetando em geral homens idosos. No entanto, o perfil da doença mudou. Agora ela atinge mais pessoas de ambos os sexos e mais jovens, em torno de 45 anos, com histórico de infecção pelo HPV (papilomavírus humano).

Estudos revelam que o sexo oral, uma das vias de transmissão do vírus, se tornou o principal fator de risco para o tumor da orofaringe, que inclui a região posterior da língua, as amígdalas e parte da garganta ou faringe. Existem diversos tipos de HPV, sendo o 16 e o 18 os mais relacionados à doença.

Um marco nesse contexto é uma pesquisa da Universidade de Birmingham, da Inglaterra, que revela como o vírus está relacionado ao desenvolvimento do agravo.

“Enquanto outros cânceres induzidos pelo HPV, como o do colo do útero, têm diminuído graças às campanhas de vacinação e ao exame preventivo realizado pelas mulheres, o câncer de orofaringe está aumentando — especialmente entre os homens”, pontua o cirurgião dentista Alan Roger dos Santos Silva, secretário da Câmara Técnica de Patologia Oral e Maxilofacial do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP).

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O xis da questão é que em grande parte dos casos, o HPV não provoca sintomas. Isso significa que a infecção pode permanecer meses ou anos sem manifestar sinais aparentes. Enquanto isso, vai passando de uma pessoa para outra…

Quando há uma queda da imunidade, no entanto, o vírus se multiplica mais e pode finalmente dar as caras. As lesões, quando provocadas por tipos benignos, surgem como verrugas, de diferentes tamanhos e formas, na região genital, no ânus e na boca. Os tipos malignos não causam verrugas, desembocam direto nos tumores.

Vacinar para prevenir

A imunização é a principal forma de prevenção ao HPV. Contudo, o Brasil ainda pena para alavancar as coberturas vacinais. Em 2024, o Ministério da Saúde adotou o esquema de dose única, validado cientificamente, com o objetivo de aumentar a adesão.

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No momento, o percentual de meninas de 9 a 14 anos vacinadas é de 69,05%, enquanto o de meninos permanece em 56%, de acordo com os dados oficiais. Em 2024, os índices foram de 82,33% para elas e de 66,76% para eles.

“Por muitos anos, a vacinação contra o HPV no Brasil era oferecida apenas para meninas. Mas, felizmente, o Sistema Único de Saúde ampliou esse cuidado e, há alguns anos, passou a incluir também os meninos no Programa Nacional de Imunização, numa atitude pioneira em nível internacional”, afirma Silva.

Essa decisão foi justamente motivada pelo aumento dos casos de câncer de boca e garganta associados ao vírus.

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A dose é oferecida pelo SUS aos seguintes públicos:

• Meninas e meninos de 9 a 14 anos.

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• Mulheres e homens que vivem com HIV, indivíduos que receberam transplante transplantados de órgãos sólidos, de medula óssea ou pacientes oncológicos na faixa etária de 9 a 45 anos.

• Vítimas de abuso sexual de 15 a 45 anos (homens e mulheres) que não tenham tomado a vacina ou estejam com esquema incompleto.

• Usuários de profilaxia pré-exposição (PrEP) de HIV, com idade de 15 a 45 anos, que não tenham tomado o imunizante ou estejam com esquema incompleto.

• Pacientes de papilomatose respiratória recorrente a partir de 2 anos de idade.

Além da vacinação de rotina, o Ministério da Saúde realiza estratégias de resgate para alcançar adolescentes e jovens que ainda não receberam a vacina. De acordo com a pasta, a ação tem foco inicial em 120 municípios que apresentam os índices mais baixos de cobertura no país.

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“Os adolescentes não vacinados representam um problema global significativo, pois, além das consequências para a própria saúde, são potenciais transmissores do HPV. O desafio é grande, porque esse público dificilmente procura os serviços de saúde para se vacinar”, explica Eder Gatti, diretor do departamento do Programa Nacional de Imunizações (PNI).

Gatti afirma que a pasta está reforçando a vacinação em escolas e adotando outras estratégias para alcançar essa população.

A vacina também está disponível na rede particular para homens e mulheres até os 45 anos. Acima dessa idade, somente com prescrição médica.

Flagrando ISTs na cadeira do dentista

O infectologista é o profissional mais associado ao diagnóstico de infecções. Mas você sabia que o dentista tem um papel importante quando o assunto são as ISTs?

“Diversas condições podem ser contraídas pela prática de sexo oral, como sífilis, gonorreia, clamídia, HPV e as hepatites A e B”, pontua o médico infectologista Álvaro Furtado, do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP) e diretor da Sociedade Paulista de Infectologia (SPI).

Essa transmissão pode ocorrer por contato direto com fluidos corporais, principalmente através de lesões presentes na mucosa oral ou em outras partes da boca, como gengiva, língua, etc.

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Nesse contexto, também cabe aos dentistas a observação de possíveis indícios de ISTs que podem aparecer por ali.

“Muitas dessas doenças podem causar lesões na boca que aparecem antes de qualquer outro sintoma no corpo. Quando o dentista reconhece esses sinais, deve orientar o paciente e encaminhá-lo ao estomatologista que, após diagnosticar a condição específica, encaminhará o paciente a um serviço de saúde especializado em infectologia para o tratamento”, explica Silva.

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As lesões bucais que indicam ISTs

Na infecção por vírus herpes simples, os indivíduos apresentam bolhas nos lábios, na gengiva, língua ou palato. As lesões podem se romper e formar úlceras locais, o que leva a sensações de formigamento e febre.

Em casos de sífilis, é comum o surgimento de uma ferida pequena, como se fosse um buraquinho, indolor e arredondada na boca. A manifestação aparece de 10 a 90 dias após o contato sexual e desaparece espontaneamente.

A candidíase, por sua vez, revela-se na forma de coceira, ardência, e manchas brancas na língua e bochechas. Já o vírus Epstein-Barr leva a um cansaço intenso, febre, dor de garganta e aumento dos gânglios do pescoço.

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Vale destacar que apesar de realizar o diagnóstico, o profissional da odontologia não participa diretamente do tratamento. A responsabilidade do profissional é de encaminhar o paciente ao médico especializado para realizar os cuidados necessários.

Com a terapia adequada a cada tipo de doença, a saúde geral e bucal pode ser restabelecida.

“O sexo oral seguro, com uso de preservativo, a vacinação contra o HPV em meninas e meninos, e as visitas regulares ao dentista,  preferencialmente ao estomatologista, são medidas fundamentais para prevenir esse tipo de câncer”, enfatiza Silva.

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